PORTO SEGURO
O sul da Bahia confirma a sua vocação de paraíso da
temporada e embala 165 mil pessoas em uma festa regada a cerveja e
lambaeróbica que vai durar até o Carnaval. A cena se repete,
diariamente, no aeroporto de Porto Seguro: pousa o avião, lotado de
turistas, enquanto, aqui embaixo, a turma que está indo embora tira as
malas do chão e saca o cartão de embarque, preparando-se para partir.
Qualé? Porto Seguro tem açúcar? Tem, claro, e eles ainda misturam
abacaxi, uva, guaraná em pó, canela, vodca, leite condensado, groselha,
mel e gelo, numa panacéia de nome sugestivo: capeta. O primeiro grande
passo foi uma estrada, a BR-367, que, a reboque do milagre econômico,
transformou a cidade para sempre. O poeta (Manuel Bandeira) disse que
lugar bom era Pasárgada: "Lá sou amigo do rei". Rezam as
cartilhas, sabemos, que no dia 22 de abril de 1500, Pedro Álvares, nosso
Cabral, veio dar nessas terras em nome da Coroa portuguesa. O grande
barato em Porto Seguro e suas imensuráveis cercanias é praia, dança e
paquera, não nessariamente nessa ordem. Desde que o aeroporto local
ganhou alguma compostura e passou a receber aviões de porte, a região
explodiu, virando um dos filés das agências de viagem. Porto Seguro
nunca mais foi a mesma depois da lambada, a moda musical e dançante que
nos anos 80 deu a volta ao mundo. A reboque do famoso roça-roça,
disseminaram-se por aqui as cabanas de praia, ou melhor, as supercabanas
de praia. Agora as cabanas são grandes negócios, ainda de sapé, mas
gigantescas, verdadeiros parques de diversão pra gente grande (e
aspirantes). Não há dados oficiais, mas os teens seguramente são
maioria. Adoram Mamonas Assassinas, mas também caem no "Samba do
Tchaco", na "Dança da Galinha", "da Garrafa",
"da Bonequinha", no "Melô do Tchan" e outras muitas,
quase todas sacaninhas, com duplo sentido, feitas mesmo para serem
dançadas pelas multidões, em uníssono vibratório, coreografia de
massa: os baianos musculosos, vestidos no estilo elegante da terra,
mostrando os passos, as mudanças marcadas dos movimentos, e a galera aqui
reproduzindo tudo, sem vergonha de ser feliz.
Quando um canta, todo mundo canta; quando um pára,
todo mundo pára; quando um bebe, todo mundo bebe. Em Porto Seguro existe
um território feito de encomenda para as galeras: Passarela do Álcool.
Olha só o que se pode comprar com 3 reais: pau do índio (conhaque,
cacau, guaraná em pó, leite condensado, açúcar e gelo), coceirinha no
saco (guaraná em pó, vodca, uva, leite condensado, açúcar e gelo),
rosquinha doce (pêssego, abacaxi, morango, vinho, leite condensado, creme
de leite, açúcar e gelo) e lambidinha nos seios (cacau, pêssego, pêra,
sidra, leite condensado, creme de leite, açúcar e gelo) - isso pra ficar
nos nomes mais comportados. Parece que a Secretaria Municipal de Turismo
andou dando em cima dos barraqueiros da passarela, criando normas para a
nomenclatura dos drinques, tamanha a esbórnia. O segundo é pra deixar
todo mundo acordado, varando a noite, que por aqui começa sempre pra lá
das 11, invariavelmente com fila pra entrar.
Do lado de lá, meros dez minutos de viagem,
alcança-se a ponta do Apaga Fogo, porta de entrada para o litoral sul,
Arraial D’Ajuda (4 quilomêtros), Trancoso (25 quilomêtros) e Caraíva
(67 quilomêtros), mitos dos almanaques praieiros e de inúmeras
histórias de malucos. É do lado de lá também que o viajante encontra
um pouco mais de sossego, praias menos freqüentadas e cabanas como
antigamente.
Durante anos, ouvimos sobre Arraial e Trancoso
histórias de hippies que deram certo, gringos barbudos negociando terras,
gente que chutou o balde na cidade grande e veio pra Arraial e Trancoso
investir a grana do telefone e da indenização. Agora está difícil
achar terras a preço de banana, muitos pescadores viraram prósperos
comerciantes e até nos fins de mundo, lá na casa do jébi jébi, como
dizem os nativos, até lá você encontra um grupo de turismo organizado,
pronto pra desorganizar falando alto, jogando latinhas e bitucas pelos
cantos.
Mas Arraial consegue se manter em cima do muro,
buscando equilibrar os assédios do progresso e a índole provinciana da
antiga aldeia de pescadores. À noite, a Ruazinha do Novelo se transforma
em Broadway (ou Bróduei, como pre-ferem os puristas). Bares espalham suas
mesinhas no calçadão e instauram espontaneamente um concurso de quem
põe o som mais alto: aqui toca reggae, ali um samba, bem em frente
Caetano e Gil, mais pra lá um Pink Floyd e tudo bem. A Lagoa Azul, em
Arraial D’Ajuda, é o símbolo maior das mudanças trazidas pelo
crescimento cego. Mexeram ali, tiraram água, desviaram, sobrou lama, à
qual se atribui agora valores medicinais. Mas as praias de Arraial
continuam baca-nas. Logo cedo, muita gente repete os hábitos imemoriais
dos nativos, a marcha setentista dos andarilhos cabeludos, largando na
Ponta do Apaga Fogo, junto do Hotel Paradise, e descendo rumo sul, 4, 5,
10 quilômetros ou até mais, conforme o fôlego, a maré, a dor no
joanete e o fator do protetor solar.
Saindo de Arraial, passa-se junto à Praia do Taípe e
Rio da Barra e, já em Trancoso, chega-se à Praia dos Coqueiros e Praia
dos Nativos. Depois de Trancoso, andando pela areia como convém,
alcançam-se lugares de ninguém, como Pedra Grande, Rio Verde, Itaquena,
Rio dos Frades, Jacumã, Espelho, Juacema e finalmente Caraíva. Trancoso,
talvez por causa dos 25 quilomêtros de terra que a separam de Porto
Seguro, continua ainda remetendo ao tempo dos jesuítas. A arquitetura das
casinhas, a Igreja de São João Batista, o Quadrado - a "praça
central", onde tudo e todos convergem -, o andar lento e
aparentemente incerto das pessoas, os vestígios da Mata Atlântica, tudo
conspira a favor do passado. Barraquinhas para beber, comer, beber,
passear, beber... - Reggae Night (Av. do Descobrimento, s/nº-, Centro,
fone 288,1368), casa de shows, lambaeróbica e bebida. - Boca da Barra
(Av. do Descobrimento, 400), auto-intitulada "A 1ª- Casa de Lambada
do Brasil", com pista de dança, show, comida e bebida. Barramares
(Rodovia Porto Seguro/Cabrália, km 70,2, Praia de Taperapuã, fone
288-2980), complexo de diversões na beira da praia com shows, pista de
dança, lambaeróbica, lojinhas, agências bancárias, jet-ski, ultraleve,
banana-boat, comida e muita bebida. - Em Arraial D’Ajuda vá à Broadway
(ou Bróduei), bem no centro, uma rua estreita transformada em calçadão,
com comércio variado, mesinhas, música tocando alto e bebida. - Também
em Arraial, programa para quem tem menos de 30, pouco juízo e
disposição para aparecer só depois da meia-noite: luau no Burako Loko,
um auê na beira da praia, com discotecagem de primeira (rock &
reggae), gente linda, aquela liberdade.
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